Revista Científica de UCES
Vol. 29 N°1 (Enero - Julio de 2024)
ISSN Electrónico: 2591-5266
(pp. 1-10)
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atendimentos semanalmente. Durante os primeiros meses a paciente apresentava um relato da sua
história de vida, que parecia um roteiro pré-determinado, escrito por mãos atentas, a cada detalhe.
Apresentava um imenso sofrimento para toda e qualquer mudança na rotina que pudesse
surgir, uma simples mudança no caminho para o trabalho, trazia uma enorme desestrutura psíquica
emocional, vivenciados por quadros choro, crises de raiva, isolamento, até a atitudes impulsivas
como brigar, discutir e se desligar do emprego, sem que houvesse de fato algum motivo implícito.
A paciente apresentava uma forma quase que robótica de vida, ela cumpria as tarefas que deveriam
ser cumpridas; estudou, se formou, trabalhava, porém, sem se envolver de forma afetiva com
nenhuma pessoa. A função exercida se apresentava como um fardo, algo que não havia desejado,
mais sim, realizado, sem ao menos saber o porquê da escolha.
As dificuldades vinculares que a paciente apresentava eram de certa forma compensadas,
pelas super habilidades que apresentava nos estudos. Além de ter se formado em odontologia, já
havia cursado medicina anteriormente. Ela apresentava um hiper foco nos estudos, que a mantinha
socialmente aceita, sem demais problemas na parte neurológica.
O relato deste caso, me possibilitou revisitar meus estudos sobre o autismo e buscar em
outros casos clínicos que já haviam passado por mim, possíveis sinais de um autismo nível 1 em
mulheres. Durante quase dois anos eu trabalhei em uma clínica psiquiatra, onde realizei o
acompanhamento terapêutico de dezenas de mulheres. A maioria delas estava internada com
diagnósticos de Transtorno Bipolar, Depressão, Transtornos de Ansiedade, Dependência de Álcool
e Drogas; não havia nenhum registro de mulheres diagnosticadas com autismo. Esta constatação me
faz pensar, o quanto as mulheres estão sendo subdiagnosticadas e tratadas equivocadamente ao
longo dos anos, e mais, o que este possível erro, pode estar gerando problemas a vida destas
mulheres.
No caso da paciente que trago neste relato, a suspeita de um possível autismo, surgiu através
de uma fala que ela trouxe em uma sessão: “Hoje me deparei na minha clínica com uma mulher que
tem autismo. Ela veio para o atendimento e logo me falou que era hipersensível ao som dos
equipamentos odontológicos por conta do autismo. Eu nunca poderia imaginar que aquela mulher
linda e inteligente era autista.” A partir deste relato que podemos dizer que foi transferencial, a
paciente percebeu que ela própria se sentia totalmente desestruturada no final de um dia de trabalho,
por conta do barulho excessivo dos equipamentos que utilizava. Foi pesquisar sobre o autismo, e a